sexta-feira, 12 de março de 2010

Um dia...


Voltando às minhas duas últimas portagens, nas quais, uma reclamavam os valores da amizade e a outra falava de uma suposta “ordinary life, musica dos Liquido”. Recordei-me de um dos meus grandes amigos e irmão espiritual… como é óbvio ele sabe muito bem de quem estou a falar, embora também estou ciente que nunca irá ler estas humildes palavras, pois não faz o seu estilo, e passo a citar “perder tempo útil de vida com essa coisa supérflua que é a internet”, mas lá tem as suas razões que nunca questionei… nem ponho em causa!
Como grande e velho amigo de estrada e dos caminhos sinuosos da juventude… não da vida, porque feliz ou infelizmente, perdem-se e ganham-se amigos ao longo da vida, mas nunca deixamos de nos recordar deles como felizmente acontece comigo… e espero que com eles também.
Recordo-me muito bem das conversas e discussões filosofais e acaloradas de café pelas noites dentro, bem regadas, abundantemente pela apreciada Tuburg (que saudades que tenho delas) sobre o sentido da vida… e se nunca estivemos de acordo (eu e esse amigo em questão), numa coisa concordávamos… nenhum de nós queria viver uma vida formatada pelos valores ditos comuns, que a sociedade teimava em nos querer impor, ou seja viver uma “ordinary life”.
Não conhecíamos muito bem o que queríamos da vida na nossa errante juventude, nem muito bem sequer onde procurar… contudo estávamos absolutamente certos do que não queríamos, e não queríamos forçosamente uma “vida ordinária” traduzindo à letra.
Se ontem palmilhamos os caminhos da juventude, cruzávamos fronteiras apenas pelo prazer de tomar um café, ouvindo os velhos Floyd como música de fundo, indo até onde a vontade nos levasse… “esquecendo-nos” no processo de avisar a família. Até mesmo, roubando miúdas um do outro… apenas porque nada mais havia para fazer de interessante! Hoje a vida fez com que tomássemos diferentes rumos… já não conversamos sobre o sentido da vida, nem sobre rumos a tomar… nem onde fomos, ou onde iremos a seguir, já nem sequer ouvimos as mesmas músicas, ou os mesmos livros (nem perdes tempo a ler as experiencias dos outros, preferes seres tu a vive-las). É um ponto de vista!
A vida ordinária tomou conta de nós… humildes almas não soubemos resistir-lhe com a devida tenacidade que havíamos prometido dar-lhe. Fomo-nos abaixo sem dar luta! Mas ambos sabíamos que iria ser assim, apenas nunca o quisemos admitir.
Seguimos cada um o seu rumo, faz sentido! A idade começa a pesar e está na altura de tomar as rédeas das responsabilidades de que outrora fugimos e abominamos. A lógica do tempo e da biologia não se coaduna com a irresponsabilidade da juventude, e o tempo… a vida encarregam-se de domar os espíritos mais selvagens como os nossos… para bem ou para mal da humanidade, é um passo que todos mais tarde ou mais cedo temos de dar em frente… para o fundo do precipício, ainda que isso possa significar o fim de quem parte ou de quem fica, depende do ponto de vista.
Onde quero chegar, é simples… já não estamos na mesma equipa, um de nós saltou em direcção ao infinito… abraçou o destino que nunca procurou… mas no fundo, apenas seu!
Sei no fundo, assim como tu, que os nossos filhos jamais serão amigos, bem como as nossas esposas… se um dia as tivermos! Nunca iremos festejar aniversários juntos, com as famílias, nem iremos envelhecer perto do jardim um do outro como os nossos pais… nem jogar uma partida de bisca lambida nos bancos de jardim, nas tardes perdidas de verão, sem nada para fazer, ouvindo o cantar dos pássaros refastelando-se ao fundo da rua nas arvores fruta do S. Alfredo, amadurecidas pelo sol dourado de Julho, olhando os netos a crescer e jogar à bola, e ai talvez recuar no tempo para os gloriosos anos 90 e para a juventude à muito ida, mas não vã a glória. Não mais iremos juntos beber, aos tempos que já lá vão, fazendo assim que o passar do tempo não se transformasse numa tortura mental e numa lenta caminhada para morte anunciada.
Perdi amigos e outros ganhei… mas tenho pena dos que para traz ficaram na inconsequência de um destino que ninguém sabe ser certo ou errado, mas lá que deixa saudades, deixa… nem esqueço do muito que aprendi, e do muito que errei também.

2 comentários:

Quelarinha disse...

Em relação à "Ordinary life", todos temos a tendência (ou desejo) de viver uma vida dita normal. Acho que não é mau... talvez seja é insuficiente. Existe um anseio na alma humana de querer, de sonhar, de experimentar algo novo, com o intuito de sermos únicos. Talvez seja uma busca para encontrar um sentido para a nossa existência. É óbvio que esta faceta está mais vincada numas pessoas do que em outras. Existem e existirão sempre os pobres de espírito, que não são mais do que clones da precariedade cultural, levando-os a uma vida traçada por regras simples.
De qualquer forma, apenas por admitires que todos nós acabamos por nos render a esse modo de vida, já é um passo para caminhares na tua própria direcção... a direcção dos sonhos.
Uma nota apenas para a fotografia do post... Em tempos passados, olhei várias vezes para essa foto e pensei para mim... "Um dia...".

Rui disse...

Acho que a medida que envelhecemos, temos a tendência para formatarmos os nossos sonhos de acordo com as novas realidades com que se nos deparam diariamente. A ambição desmedida própria da juventude que outrora nos faziam correr o mundo, hoje parecem-nos cada vez mais utópicos, é o curso natural da vida. Mais tarde ou mais cedo acabamos cair na armadilha da realidade.
Adorei o teu comentário, foi incisivo, e desprendeste certas ideias implícitas que apenas eu julguei depreender.
Um dia… pensei eu também quando precisei de uma foto para a mensagem... a isto chamo sintonia.